O GOVERNO DE SÃO PAULO tem em mãos números que demonstram um crescimento acelerado nas internações por covid-19 em hospitais públicos na cidade de São Paulo desde pelo menos 9 de novembro – ou seja, seis dias antes do primeiro turno das eleições municipais. Ainda assim, continua negando o que alguns cientistas estão chamando de “segunda onda” da pandemia de coronavírus.
Os números do Censo Covid-SP, que monitora internações hospitalares, foram entregues ao Intercept por uma pessoa que tem acesso ao sistema e analisados por um epidemiologista. Ambos pediram para não serem identificados por temerem represálias. Os dados, restritos a hospitais, alguns funcionários do governo do estado e pesquisadores, mostram as novas hospitalizações tanto em enfermaria quanto em UTIs – o que o governo estadual costuma divulgar é o total de internações.
Eles mostram que, desde 16 de outubro, a média móvel de internações na rede pública tem subido consistentemente. Em meados de outubro, essa média ficava abaixo de 150 novas internações por dia. Em 6 de novembro, ela já tinha chegado a 198; dez dias depois, passou de 290. Ou seja: é um aumento de mais de 90% em trinta dias, e isso só até o dia seguinte ao primeiro turno das eleições municipais.
Ainda assim, o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, candidato à reeleição pelo PSDB e afilhado político de Doria, deu entrevista ao Roda Viva na segunda-feira, 23, e afirmou que “não há nenhum indício” de um novo pico. “Vamos enfrentar isso sem criar expectativas de que o problema foi resolvido e sem criar qualquer tipo de fake news de que há uma segunda onda sendo escondida pela prefeitura”, disse. A declaração de Covas, que herdou a prefeitura de Doria, ocorreu seis dias depois do sistema público registrar o pico de 90% no aumento de novas internações.
Novas internações em São Paulo
Gráfico elaborado com dados do Censo Covid-SP e analisado por um epidemiologista a pedido do Intercept. Como os números têm uma grande variação diária, a opção foi fazer um média com o número de internações em um intervalo de sete dias, a chamada média móvel.
Segundo os números, as internações por covid-19 subiram primeiro nos hospitais públicos. Enquanto nos hospitais particulares o crescimento consistente de casos graves da doença só ficou claro em meados de novembro, na rede pública já era possível perceber os sinais desse aumento já no final de outubro. O ponto mais baixo da curva de novas internações na rede pública acontece em 16 de outubro e depois passa a crescer, já apontando para um repique na pandemia – o que está sendo chamado de segunda onda.
O alerta dos hospitais particulares veio a público em 9 de novembro. Dois dias depois, pesquisadores confirmaram que a segunda onda da pandemia em São Paulo já batia à porta. Apenas entre 9 e 11 de novembro, as novas internações por covid-19 na rede privada saltaram de 97 ao dia, em média, para 119. Ou seja, houve um crescimento de pouco mais de 20% em apenas dois dias.
O governo e a prefeitura, no entanto, mantiveram o discurso de que não havia indícios sobre uma segunda onda de contágio nem razão para voltar a fechar o comércio e impor restrições de circulação.
Em 12 de novembro, três dias antes do primeiro turno das eleições, o secretário de Saúde, Jean Gorinchteyn, fez ginástica com os números. Em entrevista, mostrou um slide com o balanço de pessoas internadas em todo o estado e manobrou para explicar porque o número médio de 912 pessoas internadas daquela semana era menor que o da anterior – quando houve média de 859 internações.
“Eu quero que vocês observem e façam um comparativo da semana 44 e 46. Nós tivemos um descenso. Claro que o descenso foi acentuado na semana 45, mas se consideravam aqueles números mais baixos em decorrência do feriado. Portanto, nós continuamos em decréscimo também no número de internações”, afirmou.
Foi só depois do primeiro turno, em 16 de novembro, que o governo paulista admitiu um aumento de 18% no número total de internações na semana anterior – número que leva em conta todas as internações, não apenas as novas. Naquele dia, João Doria anunciou que a revisão do Plano São Paulo, que determina o calendário de reabertura, ficaria para o dia 30 de novembro. Ou seja: novas medidas que restrinjam a circulação só serão discutidas após o segundo turno.
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