Presidente de Portugal conversou com Eleutério Guevane sobre a recuperação da pandemia, a Conferência dos Oceanos, marcada para julho de 2022 em Lisboa, a ação portuguesa para mais acolhimento de migrantes e refugiados na Europa e a concertação política da lusofonia para afirmação dos países em vários espaços internacionais.
Ele esteve em Nova Iorque, na semana passada, para participar da cerimônia de eleição de António Guterres para um segundo mandato à frente da ONU, que começará em janeiro de 2022. Neste Destaque ONU News, de 21 de junho, acompanhe a primeira parte da entrevista de Marcelo Rebelo de Sousa.
Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, de Portugal, está com a ONU News neste Destaque Especial. Presidente é bem-vindo. É um prazer tê-lo aqui de novo.
É um prazer revê-lo depois de um intervalo longo da pandemia. Desde 2019, setembro. Foi muito longo.
E para uma pessoa que é conhecida por distribuir afetos, deve ter sido muito penoso. Dos anos...Que diferença faz sair deste período?
Foi para todo o mundo. Foi muito penoso. Estamos a sair ainda do confinamento. A diferença é a seguinte: estamos a sair ainda do confinamento. É um processo que ainda demora tempo. Porque mudam as relações entre pessoas. Muda a forma a trabalhar. Há mais digital, mas o digital não substitui o lado humano. A presença. Eu espero que haja presença na Assembleia Geral, em setembro, ainda com delegações pequenas. Porque faz toda a diferença.
Uma coisa é videoconferência e o funcionamento a distância. Foi assim o ano passado. Outra coisa é o encontro humano. O encontro entre os países e entre as pessoas: a empatia, a redescoberta, depois deste período tão longo, tão difícil. Difícil pelos mortos, difícil pelos doentes, difícil pela economia que sofreu, difícil porque fecharam as relações entre pessoas e, portanto...Mesmo esta é talvez a viagem mais longa que eu fiz em um ano e meio.
Estive na Guiné-Bissau, para referir, um país irmão na mesma comunidade que formamos. É verdade que tive, mas tão longe num só dia, apesar da diferença aqui no funcionamento das Nações Unidas, ainda é um funcionamento a arrancar. Curiosamente, fiquei a saber, era o primeiro chefe de Estado que cá vinha depois da pandemia. E nessa qualidade por uma boa razão. Uma razão que é de felicidade para nós todos, que falamos a mesma língua e partilhamos os mesmos ideais, que foi a reeleição de António Guterres como secretário-geral das Nações Unidas.
E o que falou com ele?
O que falei com ele foi, primeiro: tivemos a parte da congratulação. Eu felicitei-o e ele agradeceu dizendo como estava sensibilizado. E fiquei com uma impressão muito forte de como tinha sido tão importante a presença dos nossos irmãos da língua portuguesa, aqui nas Nações Unidas, no apoio à candidatura de António Guterres. Como nós apoiamos, há já anos, a candidatura do Brasil, que vai ser membro não-permanente do Conselho de Segurança. E depois Moçambique, sabia? Moçambique vai ser, pela primeira vez, daqui a um ano e meio, membro não-permanente do Conselho de Segurança. Angola já foi duas vezes. No fundo, é o primeiro secretário-geral da Cplp.
Este é um bom momento para Portugal? O que é que sente como presidente de um país com esta posição de liderança em organizações internacionais?
Eu sinto...tenho um duplo sentimento. O primeiro sentimento é enquanto presidente de todos os portugueses. Todos eles estão aqui, hoje, pela minha voz, pela minha presença a apoiar, a agradecer e a louvar o primeiro mandato de António Guterres.
E a apostar tudo num segundo mandato em tempos difíceis da saída pandemia, da recuperação da crise económica e social, da abertura do mundo, do restabelecimento relações entre grandes, médias e ditas pequenas potências e, ao mesmo tempo, dos desafios climáticos. Os oceanos, que nos ligam muito, aliás haverá uma conferência dos Oceanos, em Portugal, em julho do ano que vem, das Nações Unidas. Mas depois, além disso, o que há de papel das novas gerações, de papel da mulher, de conflitos regionais à espera de solução, do digital e do que mudou na vida das pessoas, da transição energética ...são tantos desafios. Tantos, tantos.
Isso eu sinto que é uma honra para os portugueses verem à frente de uma instituição tão importante como secretário-geral um português. E depois, não escondo o lado pessoal. Eu conheço António Guterres desde os 16 anos de idade. Formávamos parte do mesmo grupo. Sonhávamos em conjunto trabalhávamos em conjunto. Portugal era uma ditadura, sonhávamos com a democracia, sonhávamos com o desenvolvimento, sonhávamos com a descolonização que era crucial.
Sonhávamos com uma nova comunidade de países que falam a mesma língua. Sonhávamos com tanta coisa diferente e quis o acaso, ou o destino, que muitas décadas depois, eu pudesse como presidente da República Portuguesa testemunhar duas vezes a eleição do meu companheiro de luta daquela altura. Em democracia, ele foi primeiro-ministro eu era o líder da oposição. Mas continuávamos, naturalmente, a manter a mesma amizade de sempre e até uma cumplicidade a pensar na sociedade portuguesa. Eu viabilizei vários orçamentos estando na oposição e chegamos a acordos de regime muito importantes. Portanto, este lado afetivo junto ao lado português, mas também junto ao lado que nos une a nós que muitas décadas depois a Cplp.
E junto a aquilo que eu penso que o interesse real do mundo ter um homem destes. A mensagem de hoje do secretário de Estado norte-americano, é isso mesmo, a mensagem da insuspeita embaixadora do Reino Unido, que falou pela Europa, apesar de já não ser da União Europeia, e disse isso mesmo: este homem por aquilo que fez, por aquilo que é, pelo respeito e pelo afeto que tem pelas pessoas, por aquilo que ele sofre com os mais pobres, com os mais explorados, com os mais dependentes, fazendo pontes é a pessoa certa, no momento certo, no lugar certo.
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