Isso porque, em primeiro lugar, os ex-presidentes dos EUA nunca ficaram dentro de uma cela — o que não significa que todos os mandatários do Executivo tenham seguido fielmente a lei. Presidentes acumulam créditos por grandes favores, os quais eles utilizam, figurativa e literalmente, quando deixam o cargo. No extremo mais modesto do espectro, 20 amigos ricos de Ronald Reagan compraram uma mansão em Bel-Air, Los Angeles, para ele e Nancy viverem após o mandato do republicano. De forma mais significativa, ex-presidentes recebem proteção política de seus aliados, como quando Gerald Ford perdoou Richard Nixon por qualquer coisa que tivesse feito na presidência.
Presidentes acumulam créditos por grandes favores, os quais eles utilizam quando deixam o cargo.
Além de tudo que um presidente faz concretamente pelos setores que o apoiam, esses segmentos se opõem veementemente a eventuais consequências das ações de seus aliados no Executivo — por razões básicas de solidariedade de classe. Um ex-presidente responsabilizado pelo que fez sugere que as pessoas nos níveis abaixo do poder também podem enfrentar as consequências de seus atos. Mas quem está no topo da sociedade norte-americana vê responsabilidades da mesma forma que a empresária Leona Helmsley entende os impostos: são apenas para a ralé, as pessoas comuns.
Dito isso, aconteceram coisas mais estranhas do que as acusações contra Trump — a começar pelo fato de ter sido eleito presidente, por exemplo.
Trump está mais vulnerável a acusações do que os presidentes anteriores, porque pode ter se envolvido em diversos crimes não tradicionais. Com a invasão do Iraque, George W. Bush cometeu o que os julgamentos de Nuremberg classificaram de “o crime internacional supremo” de iniciar uma guerra. Mas nunca houve qualquer chance de que ele fosse punido por isso, porque toda a estrutura do poder dos EUA concorda que os presidentes americanos têm o direito de fazê-lo. O mesmo vale para a realização de milhares de ataques com drones e de torturas no mundo inteiro. Por outro lado, Trump teria se envolvido em possíveis atividades criminosas relativamente menores, que não necessariamente dizem respeito à presidência.
Atualmente, as leis federais protegem Trump de ser indiciado porque ele é o presidente. Há décadas o Departamento de Justiça considera que não pode processar presidentes durante seus mandatos — o ex-procurador especial Robert Mueller concordou e explicou que nunca teve a opção de acusar Trump porque isso seria inconstitucional. Esteja essa perspectiva correta ou não, o procurador-geral William Barr é um homem leal que nunca agiria contra o patrão.
Conforme decisão recente da Suprema Corte, Trump poderia teoricamente ser acusado de violar leis estaduais enquanto ocupa o cargo máximo do Executivo. Na prática, entretanto, isso é bem improvável.
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