terça-feira, 17 de novembro de 2020

UMA REPORTAGEM DO INTERCEPT FOI CENSURADA E NÓS DESCOBRIMOS O MOTIVO Fomos obrigados a tirar uma reportagem do ar pela primeira vez em nossa história – graças às relações entre política e Judiciário no Amazonas.

 



SE VOCÊ TENTOU acessar a reportagem Candidato de Manaus conta com o hospital da família, a covid e o Judiciário para subir nas pesquisas” e não conseguiu, o motivo é simples: nós fomos censurados. O texto, publicado em 13 de novembro e retirado do ar pela Justiça Eleitoral amazonense dois dias depois, contava como o candidato agora derrotado à prefeitura da capital Ricardo Nicolau, do PSD, aproveitou o acesso privilegiado que tinha ao interior do hospital municipal de campanha de Manaus para gravar imagens vestido de branco e visitando leitos de pacientes como se fosse um médico – ele não é.

O material foi usado em sua campanha eleitoral para colar a imagem de Nicolau a do hospital, construído em quatro dias. A propaganda também tentava criar a narrativa de que o candidato (que ficou em 4º lugar, com 12% dos votos) foi responsável pelo tratamento de centenas de pacientes com covid-19. Para isso, Nicolau usava o livre acesso que tinha ao hospital de campanha da capital, já que ele era parte do grupo Samel, rede de hospitais privados da sua família. A Samel administrou a unidade por uma parceria público-privada com a prefeitura de Manaus.

A reportagem também mostrava que parte das ações judiciais movidas pelos adversários de Nicolau caíram no gabinete da juíza eleitoral Margareth Rose Cruz Hoaegen. Ela decidiu em favor do candidato em dois processos que questionavam o uso do nome do grupo Samel e das imagens filmadas dentro do hospital municipal de campanha. Para os adversários, aquilo se tratava de abuso do poder econômico ou propaganda ilegal, mas a magistrada discordou. A juiza Hoaegen, que julgou em seu favor nas decisões, como mostramos na reportagem censurada, é grande amiga de Jeanne Nicolau, cunhada do candidato. A juíza também esteve no aniversário de Jean Cleuter, advogado de Ricardo Nicolau.

Nossa reportagem incomodou o candidato Nicolau. Ele não queria apenas a exclusão da matéria, mas que a Justiça Eleitoral retirasse todo o Intercept do ar. Nicolau entrou com quatro representações praticamente iguais contra a publicação no Tribunal Regional Eleitoral no sábado, 14. Nicolau é um homem de sorte: uma delas caiu nas mãos do juiz Alexandre Henrique Novaes de Araújo, que, assim como a juíza Hoaegen, também tem relações próximas com o grupo Samel e com a família Nicolau.

Araújo manteve o site no ar, mas determinou a censura do texto alegando que “a publicação imputa fatos sabidamente inverídicos” sem discriminar que fatos são esses. Até agora, não sabemos o que, na reportagem, era “sabidamente inverídico”.

Sentença4 pages

Ação entre amigos

O juiz Araújo, que determinou a censura à reportagem, foi um dos ilustres convidados de uma festa que celebrava o aniversário de Alberto Nicolau, irmão do candidato derrotado Ricardo Nicolau. Além de principal doador da campanha do irmão (R$ 1 milhão), Alberto é também diretor-presidente do grupo Samel. O evento aconteceu no dia 21 de agosto, no último andar do prédio da Samel, o “rooftop mais disputado da cidade”.

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