“Enquanto o detento está lá, preso, e passa mal, em tese ele é encaminhada para tratamento, sob responsabilidade do estado. Quando o estado libera a pessoa contagiada, é como se ele desonerasse dessa obrigação”, reiterou Prando. Isso significa que a contagem das possíveis mortes dentro do sistema pode diminuir. “É um sinal que eles usaram essa estratégia. Parece uma estratégia de prevenção de contágio, quando na verdade é uma estratégia de desoneração da responsabilidade do estado”, observa a professora.
Enquanto estavam no presídio, os técnicos foram avisados de que o que acontecia ali estava prestes a se repetir no Abrigo São Vicente de Paulo, distante 2 km dali. O local, uma entidade de assistência social gerida pelo governo e que recebe idosos tinha, no dia da visita, 18 pessoas com sintomas de coronavírus. Uma delas foi internada, e havia outros dois pacientes em isolamento.
Mas Zema não é o único a virar as costas aos presídios.
Em março, eu revelei que a juíza responsável pela Vara de Execuções Penais de Roraima alertava para a situação dos presídios do Estado e pedia providências para conter a disseminação do coronavírus. Havia ali um presídio sem água encanada e em obras, com trânsito livre entre presos e pedreiros, que iam e vinham como se o país não estivesse em uma pandemia. O governo respondeu que não havia como cumprir todas as medidas. Dito e feito. Menos de dois meses depois o estado já registrava o segundo maior número de presos mortos por covid-19 no país, atrás de São Paulo.
O descaso com os detentos fez o Brasil ser denunciado na ONU e OEA pelo avanço do coronavírus nos presídios. As instituições que entraram com a ação dizem que o estado brasileiro deve ser questionado sobre violações de normas e recomendações internacionais em relação à falta de acesso à saúde, entraves ao desencarceramento, incomunicabilidade, problemas no registro de óbitos, rebeliões e uso de estruturas temporárias precárias para o abrigo dos presos.
O próprio Conselho Nacional de Justiça, o CNJ, aponta que, entre maio e junho, houve um crescimento de 800% no número de casos de coronavírus nos presídios do país. O aumento se deu num contexto de subnotificação: menos de 2% dos presos do país foram testados.
Na verdade, o que ocorre nas cadeias obedece padrão geral da negligência com a população brasileira. A pandemia já é grave sem o país saber a real dimensão do problema devido à subnotificação e à falta de testagem em massa. O quadro pode ser muito pior. Mas é como a frase-bordão: “0 que os olhos não veem, o coração – e a consciência – não sentem.
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