segunda-feira, 22 de junho de 2020

Bolsonaro mudou Lei de Acesso à Informação para driblar pedido de site de notícias

Para evitar que o site de notícias UOL tivesse acesso às folhas de ponto de Luiza Souza Pinto, ex-assessora de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio (ALERJ), o presidente da República restringiu por decreto a abrangência da lei, reduzindo a transparência sobre dados e documento públicos.


Luiza é uma das funcionárias citadas no relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras e as investigações revelam que no escândalo conhecido como rachadinha, ela repassou a quantia de 155,7 mil reais para Fabrício Queiroz, preso na quinta-feira (18), na casa do então advogado de Flávio, em Atibaia, interior de São Paulo.

Este valor equivale a 76% de tudo que recebeu como assessora do filho do presidente da República. Leia a íntegra da reportagem publicada pelo UOL:

Um requerimento feito pela reportagem do UOL com base na LAI (Lei de Acesso à Informação) motivou uma articulação para fraudar os registros de controle de ponto de uma ex-assessora do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio). No mesmo dia em que a manobra foi concluída, o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) restringiu por decreto a abrangência da lei, reduzindo a transparência sobre dados e documentos públicos.

No dia 10 de dezembro de 2018, a reportagem solicitou acesso às folhas de ponto de Luiza Souza Paes, uma das ex-assessoras de Flávio Bolsonaro citadas no relatório do antigo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) —hoje rebatizado como UIF (Unidade de Inteligência Financeira). As investigações apontam que ela repassou R$ 155,7 mil para Queiroz —mais de 76% de tudo que recebeu como assessora parlamentar. Ela é uma das pessoas investigadas por participação no suposto esquema de rachadinha no gabinete de Flávio —quando funcionários devolvem parte de seus salários para um político.

Segundo as investigações do MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro), o servidor da Alerj Matheus Azeredo Coutinho entrou em contato com Luiza para alertar sobre o pedido. Os pontos não tinham sido preenchidos, forte indício de que a ex-assessora era, na verdade, uma funcionária fantasma. A adulteração foi concretizada na manhã de 24 de janeiro, mesma data em que um decreto foi publicado no Diário Oficial da União restringindo o acesso a informações por meio da LAI.

De acordo com esse decreto —que foi parcialmente revogado um mês depois—, um número muito maior de servidores públicos podia classificar documentos e dados como reservados, o que os colocaria sob um sigilo de cinco anos. A medida valia apenas no âmbito federal e deu essa prerrogativa a mais de 2.000 pessoas —incluindo ocupantes de cargos comissionados de livre indicação política. No entanto, abria brecha para que outros entes federativos e poderes adotassem providências similares.

Embora o decreto tenha sido assinado por Hamilton Mourão —que exercia a Presidência durante a viagem de Bolsonaro ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça—, o próprio vice-presidente declarou à época que a medida foi avalizada por Bolsonaro. “Isso já vinha do governo anterior. O presidente Temer é que não assinou. O presidente Bolsonaro deu luz verde”, disse Mourão.

Essa é a segunda coincidência entre movimentações clandestinas investigadas pelo MP-RJ de pessoas ligadas a Flávio Bolsonaro e atos envolvendo o presidente Jair Bolsonaro. No sábado (20), o UOL mostrou que Bolsonaro se encontrou com Frederick Wassef —advogado de Flávio Bolsonaro no caso da rachadinha até esta manhã— horas depois de a mulher de Fabrício Queiroz receber a resposta de uma proposta feita ao miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega, chefe do Escritório do Crime.

Pedido ficou parado com assessor investigado por 8 dias
Matheus entrou em contato com Luiza no dia 17 de janeiro. Fontes na Alerj confirmam que o requerimento de informação chegou ao Departamento de Legislação de Pessoal —exatamente o setor em que Matheus trabalhava— no fim do expediente do dia anterior.

O pedido seguiu parado no setor de Matheus até a tarde de 24 de janeiro. De acordo com as investigações —que resultaram na deflagração da Operação Anjo na última quinta-feira (18)—, foi justamente na manhã deste dia que Luiza foi à Alerj assinar os pontos que estavam em branco, encobrindo assim possíveis evidências de que não trabalhava de fato.

De acordo com conversas em um aplicativo de mensagens apreendidas pelos promotores no celular de Luiza, a articulação para que a suposta fraude fosse consumada teve a participação de duas pessoas de confiança de Flávio Bolsonaro: o próprio Fabrício Queiroz e o advogado Gustavo Botto, que representava Flávio nas investigações da rachadinha naquela ocasião.

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