Por Daniel Carvalho e Ricardo Della Coletta
Na próxima quinta-feira (22), a reunião ministerial que o ex-ministro da Justiça Sergio Moro dizia provar a interferência do presidente Jair Bolsonaro na autonomia da Polícia Federal completa um ano. Desde então, o presidente passou a dar as cartas na PF, mas também perdeu seis ministros que ocupavam assentos naquele encontro, 26% de seu primeiro escalão.
Dois pediram para sair, enquanto quatro foram demitidos para solucionar problemas enfrentados pelo chefe do Executivo.
O vídeo da reunião só se tornou público um mês depois, por decisão de Celso de Mello, então ministro do STF (Supremo Tribunal Federal). Falas memoráveis foram proferidas no encontro.
De Bolsonaro vieram manifestações como: “Eu não posso ser surpreendido com notícias. Pô, eu tenho a PF que não me dá informações”; “Não dá pra trabalhar assim. Fica difícil. Por isso, vou interferir! E ponto final, pô! Não é ameaça, não é uma extrapolação da minha parte. É uma verdade”.
O presidente também disse: “É putaria o tempo todo pra me atingir, mexendo com a minha família”.
“Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmente, e não consegui”, afirmou. “Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem”, disse. “Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui para brincadeira”, disse.
O presidente nega até hoje interferência na PF, que, recentemente, passou por uma série de mudanças.
O diretor-geral da instituição, Paulo Gustavo Maiurino, decidiu trocar o chefe do órgão no Amazonas, Alexandre Saraiva, nos últimos dias.
A mudança ocorreu em meio a um atrito entre Saraiva e o ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente) por causa da maior apreensão de madeira do Brasil. Na quarta-feira (14), o delegado enviou uma notícia-crime ao STF pedindo que o ministro fosse investigado sob suspeita de advocacia administrativa e de atrapalhar a fiscalização ambiental.
O conflito entre Alexandre Saraiva e o ministro do Meio Ambiente começou após uma visita de Salles ao local da apreensão, no Pará, para uma espécie de verificação da operação. Saraiva criticou a atitude, dizendo ser a primeira vez que viu um titular da pasta se posicionar contra ação de preservação da floresta amazônica.
“Na Polícia Federal não vai passar boiada”, disse Saraiva à Folha, usando o mesmo termo empregado por Salles na reunião ministerial do ano passado. “Precisa ter um esforço nosso aqui, enquanto estamos neste momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de Covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”, disse Salles em 22 de abril do ano passado.
Somente em 2020, o governo publicou 500 atos que podem trazer mudanças significativas na área ambiental.
Com dez dias no cargo, o novo diretor-geral da PF fez trocas de chefia em São Paulo, Bahia, Santa Catarina e Roraima. Mexeu ainda no setor de combate à corrupção.
Maiurino entrou no lugar de Rolando de Souza, que, por sua vez, só chegou ao comando da PF porque o STF barrou a indicação de Alexandre Ramagem em razão de sua proximidade com a família Bolsonaro.
Da reunião para cá, Bolsonaro também fez movimentações no Ministério da Justiça: Sergio Moro pediu demissão e o presidente colocou André Mendonça –que na época era advogado-geral da União, cargo que reassumiu agora. No fim de março, o presidente escalou Anderson Torres para o posto.
Naquele 22 de abril, Bolsonaro também defendeu política armamentista. “Eu quero todo mundo armado, que povo armado jamais será escravizado”. Na véspera do feriado de Carnaval, Bolsonaro editou quatro decretos que flexibilizavam a posse e o porte de armas, mas a ministra Rosa Weber, do STF, suspendeu trechos.
Mas não apenas o presidente e Salles ficaram marcados pelo encontro. Abraham Weintraub, então ministro da Educação, perdeu o cargo menos de um mês após a divulgação do vídeo.
Antes mesmo da divulgação do vídeo, Nelson Teich saiu do governo. Ele já era o segundo ministro da Saúde na pandemia, depois de Luiz Henrique Mandetta. Deixou a pasta após pressão de Bolsonaro pela defesa da cloroquina.
Em dezembro, Bolsonaro demitiu outro ministro presente à reunião. Marcelo Álvaro Antônio foi tirado do Ministério do Turismo depois de acusar, em grupo de WhatsApp, o general Luiz Eduardo Ramos, naquela época ministro da Secretaria de Governo, de estar negociando sua cadeira no Congresso. Foi substituído pelo então presidente da Embratur, Gilson Machado.
Desgastado por causa das dificuldades diplomáticas com países produtores de vacinas e de insumos, Ernesto Araújo perdeu o emprego após pressão do Congresso no fim de março.
No mesmo dia, Bolsonaro promoveu seis trocas e também tirou o general Fernando Azevedo e Silva do Ministério da Defesa, entregando o comando da pasta para o general Walter Braga Netto, seu ministro da Casa Civil
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