A situação do Centro Novos Horizontes (CNH) de Arroio dos Ratos, que pegou fogo na quinta-feira, estava regular — mas não deveria. Em janeiro, um fiscal da Vigilância Sanitária esteve na clínica para dependentes químicos e viu grades e cadeados em portas e janelas. Mesmo assim, deu o aval e a Secretaria Municipal de Saúde emitiu o alvará sanitário necessário para o local fosse mantido em funcionamento. Quem reconhece o erro é a titular da pasta, Ivete Canha:
Publicidade
— Eu assinei o alvará porque confio e dou autonomia para os profissionais atuarem. E ele falhou, infelizmente.
Ivete diz que tem conhecimento do artigo 15 da resolução 29 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que é explícito: "Todas as portas dos ambientes de uso dos residentes devem ser instaladas com travamento simples, sem o uso de trancas ou chaves".
Leia mais:
Justiça pode decretar nesta prisão de dono e funcionários da clínica"Queria ter salvo meu irmão", diz monitor da casa que estava de folga
Prefeito se exime de responsabilidade na fiscalização da clínica
Justiça pode decretar nesta prisão de dono e funcionários da clínica"Queria ter salvo meu irmão", diz monitor da casa que estava de folga
Prefeito se exime de responsabilidade na fiscalização da clínica
Todos os sete mortos estavam confinados em quartos chamados de centro de observação (CO). Semelhantes às celas do sistema prisional, os espaços têm grades nas janelas e atrás da porta, trancados pelo lado de fora por cadeados. Ali os internos passavam o dia, com exceção de uma hora ou duas de permissão para banho de sol.
A secretária diz que conversou com o então fiscal, que agora ocupa outra função na prefeitura. Ele relatou que, na época da fiscalização, notou as travas e questionou um dos responsáveis pelo CNH. Obteve como resposta que os cadeados eram usados apenas em casos extremos, quando algum interno estivesse muito agitado ou entrasse em surto. O fiscal alegou, ainda, que durante a visita as portas estavam com passagem livre.
Ivete reconhece que não poderia haver nenhum tipo de trava e que, como se trata de centro terapêutico, caso algum paciente tivesse uma crise, deveria ser levado ao pronto socorro, mas que não poderia ficar trancado.
— Ele (fiscal) admite a responsabilidade. Provavelmente será chamado e eu também. Estamos à disposição da prefeitura, da polícia e de quem quer que seja. Ninguém está se eximindo — disse a secretária de Saúde.
Na quinta-feira, em conversa com ZH, o prefeito José Carlos Garcia de Azeredo disse que a instituição tinha todas as licenças ambientais e sanitárias em dia e alvará dos bombeiros válido até 2017, mas procurou de eximir da responsabilidade. Disse que, como o município não tinha convênio com a CNH, não tinha "ingerência lá dentro" e que não era obrigado a fiscalizá-lo.
Em nota divulgada nesta quinta-feira, a Secretaria Estadual da Saúde tratou o estabelecimento como uma comunidade terapêutica — tipo de serviço que oferece atenção a viciados depois da desintoxicação, realizada em ambiente hospitalar ou clínica especializada. Nesse caso, a entidade estaria em conflito com a lei. Manter internos trancafiados contraria as regras do Ministério da Saúde sobre as comunidades terapêuticas.
A resolução 29 da Anvisa também diz que a permanência dos pacientes deve ser voluntária, garantida "a possibilidade de interromper o tratamento a qualquer momento".
A diretoria do CNH ainda não se manifestou oficialmente sobre o incêndio nem sobre as condições da unidade de Arroio dos Ratos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário