sábado, 26 de dezembro de 2020

Falar da Fox News é falar da família Murdoch

 

UMA PERGUNTA capciosa sobre a controvérsia envolvendo o laptop de Hunter Biden, filho de Joe Biden, candidato à presidência dos EUA: quem tem mais culpa por dar a esse pseudoescândalo muito mais atenção do que ele merecia? O jornal New York Post, por publicar a primeira matéria duvidosa, ou a Fox News, por promovê-la em uma série de transmissões?


A resposta é: nenhum dos dois. Os maiores culpados são a família Murdoch, dona de ambos os veículos. A Fox e o Post são elementos-chave de um império midiático construído ao longo de décadas por Rupert Murdoch, de 89 anos, que atualmente compartilha a propriedade com seus seis filhos, um dos quais é presidente da principal empresa da família, a Fox Corporation. Embora o Post não tenha muito alcance para leitores fora de Nova York, a Fox é uma marca de âmbito nacional, com um fluxo de lucros que ajudou a tornar multibilionária a família Murdoch. Dado que a Fox é um “nó central” da máquina de conspirações da extrema direita, é razoável considerar que os Murdoch são a família real da desinformação nos EUA.


Os Murdoch, no entanto, atraem muito menos atenção do que os seus capatazes, os jornalistas e comentaristas estridentes que minimizaram a covid-19 e criaram todo o conteúdo delirante que ajudou a catapultar Donald Trump para a Casa Branca. Em cerca de uma dúzia de matérias publicadas a respeito da controvérsia do laptop de Biden, o New York Times só se referiu aos Murdoch em duas delas, de passagem. No Washington Post, apenas três matérias sobre o laptop mencionam os Murdoch – da mesma forma, de passagem.


Não faltam notícias sobre o conteúdo lamentável produzido pela máquina dos Murdoch, mas há excepcionalmente poucas sobre o fato de que os Murdoch estão por trás dela. Como observou no Twitter o âncora da MSNBC, Chris Hayes, logo que surgiu a primeira matéria sobre o laptop: “Numa seleção entre pessoas de países da OCDE considerados ostensivamente democracias liberais, Rupert Murdoch deve estar no alto da lista como a pessoa individualmente mais destrutiva das últimas três décadas, não é?” Mas Hayes talvez seja parte do problema. Embora ele critique a Fox com frequência, e em alguns raros casos até discuta sobre os Murdoch, na maior parte do tempo ele não menciona que a família poderia literalmente virar uma chave e estancar o veneno. Em 20 de abril, Hayes fez um segmento de 8 minutos debatendo como a Fox encorajou protestos contra os decretos de isolamento social, e na semana seguinte passou 7 minutos detalhando como a Fox minimizou a covid-19 – mas embora tenha nomeado apresentadores e convidados que disseminaram mais desinformação, o nome “Murdoch” não foi pronunciado.

Nas situações em que se dá ao trabalho de voltar o foco para os Murdoch, a imprensa normalmente faz o oposto do que deveria: ela os afaga. O exemplo mais recente apareceu este mês no New York Times, na forma de um perfil favorável do filho mais novo de Rupert, James, que atou diligentemente por anos como alto executivo e membro do conselho de administração dos negócios globais da família (cujo patrimônio inclui veículos de mídia de grande porte no Reino Unido, na Austrália e na Ásia, e nos EUA inclui o Wall Street Journal).


 James, que perdeu uma batalha sucessória para o irmão mais velho Lachlan, deixou sem alarde este ano seu último posto de conselheiro, e manifestou um leve arrependimento em relação ao Frankenstein criado por sua família. “Minha saída se deve a desentendimentos em relação a determinados conteúdos editoriais publicados pelos veículos de notícias da Companhia e certas outras decisões estratégicas”, escreveu em sua breve carta de demissão. O mencionado jornal o tratou, então, como herói – a matéria, elaborada por Maureen Dowd, vinha intitulada: “James Murdoch, Herdeiro Rebelde”. Em 2018, Lachlan Murdoch foi um dos convidados em uma conferência de negócios do Times, onde recebeu apenas perguntas uniformemente amigáveis do colunista Andrew Ross Sorkin, que incluíam: “Você assiste [a série] ‘Succession’?”

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