quinta-feira, 6 de junho de 2019

STF proíbe privatização de estatais sem aval do Congresso, mas permite venda de subsidiárias


O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (6) que o governo não pode vender estatais sem aval do Congresso Nacional e sem licitação quando a venda implicar em perda de controle acionário. A venda só será permitida para as empresas estatais subsidiárias.

A decisão também vale para governos estaduais e prefeituras. O governo federal tem, segundo o Ministério da Economia, 134 estatais, das quais 88 são subsidiárias. A Petrobras, por exemplo, tem 36 subsidiárias, a Eletrobras, 30, e o Banco do Brasil, 16.

A maioria dos ministros foi a favor do que o governo pretendia: a flexibilização de regras para a comercialização de estatais. Para a corrente majoritária, a flexibilização não fere a Constituição e pode favorecer o crescimento econômico.

Ao tomar a decisão, o plenário do STF derrubou em parte uma decisão liminar (provisória) concedida no ano passado pelo ministro Ricardo Lewandowski, que havia proibido o governo de vender estatais sem autorização do Congresso.

Lewandowski proibiu a venda ao analisar uma ação apresentada pela Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf).

O plenário do STF começou a julgar o tema na semana passada. Nesta quarta (5), Lewandowski foi o primeiro a votar e manteve a decisão de 2018. Com os votos dos demais ministros, o placar ficou empatado em 2 a 2, e a sessão foi interrompida.

Nesta quinta (6), a sessão foi retomada, e a Corte se dividiu entre diferentes correntes de voto:

Ricardo Lewandowski e Edson Fachin, por exemplo, votaram a favor do aval do Poder Legislativo para venda de qualquer empresa pública;
Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Rosa Weber, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Dias Toffoli votaram para autorizar a venda de subsidiárias sem aval do Congresso. Com exceção de Cármen Lúcia e Marco Aurélio, o restante dos magistrados desta corrente de voto entendeu que não é necessária licitação.
Interesse de R$ 80 bilhões
Apesar de o Supremo ter divulgado a pauta de todo o semestre no fim do ano passado, a ação foi incluída na pauta de julgamentos somente em maio para solucionar impasses de interesse do governo federal em relação a vendas de ativos e privatizações.

Dados do governo indicam que o país pode gerar de caixa mais de R$ 80 bilhões com privatizações.

Nas últimas semanas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o advogado-geral da União, André Mendonça, conversaram com ministros do Supremo e defenderam a importância do tema para o governo.

Como votaram os ministros
Ricardo Lewandowski: ao apresentar o voto na sessão desta quarta (5), o relator da ação manteve o entendimento que o levou a conceder liminar suspendendo a venda de estatais sem aval do Legislativo. Para o ministro, "crescentes desestatizações" podem trazer prejuízos ao país. Segundo ele, é necessária autorização de lei para a venda das empresas públicas sempre que houver perda do controle acionário. 

"A Carta [Constituição] de 1988 exige sempre a aquiescência do Poder Legislativo aos processos de criação de entidade governamental dessa espécie, ainda que tenha sido criada para explorar atividade econômica em sentido estrito", argumentou. Lewandowski destacou ainda que o Estado não pode "abrir mão" da exploração de determinada atividade econômica sem a necessária participação do Congresso, uma vez que a decisão não compete exclusivamente ao chefe do Executivo.

Alexandre de Moraes: o ministro divergiu do relator, deflagrando a corrente que entendeu que o aval do Congresso só é necessário quando se tratar da "empresa-mãe". "Entendo que o Estado possa vender todas as suas ações de uma determinada subsidiária. Está nas regras do mercado privado. Me parece que a única limitação é perder o controle acionário da empresa-mãe. Aí estamos falando de privatização". Na visão do magistrado, se não tiver instrumentos de gestão empresarial idênticos aos do mercado, a estatal não é competitiva. Em relação às licitações em subsidiárias, ele defendeu maior agilidade e competitividade.

Edson Fachin: o magistrado ressaltou que, na interpretação dele, a Constituição exige lei para a venda de estatais. "Esta é a escolha que fez o constituinte originário", enfatizou. Conforme Fachin, a autorização legislativa "deflui dos precedentes do tribunal e também do texto constitucional". Ele destacou ainda que o pedido de dispensa de licitação feito ao Supremo "extrapolou os limites da lei", "pois dispensou, sem lei específica, a transferência de ativos sem necessário procedimento de licitação".

Luís Roberto Barroso: se posicionou a favor de permitir a venda de estatais sem aval do Congresso ou licitação. "A Constituição não tratou deste assunto", ponderou Barroso. Na visão dele, "raramente uma Corte constitucional deve interferir" na ordem econômica. "Para desinvestir, não vale a mesma regra que vale para criar”, observou Barroso.

 "Não é preciso lei e muito menos lei específica." O ministro também disse que não há nenhuma dúvida de que a lei pode dispensar a licitação. "Vender ações de uma empresa é diferente de contratar uma obra ou de vender um imóvel." De acordo com Barroso, é preciso apenas que o certame assegure a melhor opção para o poder público.

Cármen Lúcia: em seu voto, a ministra afirmou que não é necessária autorização legislativa para alienação de subsidiárias. "Não me parece que para essas seja necessária a autorização legislativa expressa", ponderou a magistrada. A ministra também defendeu a lei de licitações e ressalvou que o problema não é a legislação, e sim quem não a cumpre. "A lei de licitação cria uma série de entraves e dificulta a vida, mas veio dar uma resposta", enfatizou.

Rosa Weber: a magistrada defendeu a necessidade de uma lei genérica autorizando a venda de estatais. "Entendo suficiente a autorização genérica", declarou. Segundo Rosa Weber, já há lei que autoriza privatizações no caso de subsidiárias da Petrobras. "Não se exige lei específica para cada caso de criação de subsidiária, desde que haja autorização legislativa genérica". Ela argumentou ainda que há exceções previstas em relação à obrigatoriedade de licitação, mas sempre baseadas em lei.

Luiz Fux: o magistrado acompanhou o voto ministro Alexandre de Moraes para permitir a venda das estatais sem aval do Congresso. "Eficiente é o sistema que propicia flexibilização das estatais e alienação de subsidiárias que vêm causando prejuízos", defendeu. Segundo Fux, essas operações vão trazer aos cofres públicos dinheiro "essencial". 

"Eu compararia ao êxito da reforma da Previdência esse desinvestimento, que não é desestatização. Neste momento, é mais importante do que a reforma da Previdência porque os valores reverterão mais celeremente para os cofres públicos". Ele também defendeu que a venda de estatais ocorra sem licitação, com base no princípio da eficiência, para "atração de investidores".

 "O Brasil vive um momento que precisa de investimentos, mercado de trabalho e precisa vencer essa suposta moralidade que há com a tutela excessiva das empresas estatais", completou.
Gilmar Mendes: em seu voto, o ministro defendeu que não é expressa na Constituição a necessidade de aval do Congresso para processos de desestatização.

 "Se é compatível com a Constituição a possibilidade de criação de subsidiárias, não há como obstar a alienação de empresa subsidiária, ainda que a medida envolva a perda de controle acionário do estado". "É dispensável a autorização legislativa específica para a alienação quando houver previsão na própria lei que instituiu a empresa estatal matriz", acrescentou.

Marco Aurélio Mello: o ministro votou pela desnecessidade de autorização legislativa para a venda de subsidiárias. O ministro argumentou que nenhum parlamento tem interesse na extinção de sociedades de economia mista e subsidiárias. “Ao contrário, se pudesse, criaria até mais”, afirmou. O magistrado destacou que a licitação é necessária e votou para manter a liminar nesse sentido.

Celso de Mello: o decano da Corte, ministro Celso de Mello, afirmou que quando o estado intervém como agente econômico, não há necessidade de lei específica para alienar subsidiárias. “Apenas quando a lei que autoriza a constituição da entidade matriz, da empresa estatal, é omissa. No mais, incide a jurisprudência, que se satisfaz com a autorização genérica”, disse. “Não há necessidade de qualquer autorização legislativa, inclusive no tocante ao poder acionário.” 

Sobre a necessidade de licitação, o ministro afirmou que a exigência objetiva concretizar os princípios da administração pública, como eficiência, moralidade e economicidade. “Se justifica a Constituição quando estabelece a necessidade de licitação quanto ao poder público”, afirmou. Segundo Celso de Mello, no entanto, há exceção na própria Constituição permitindo que a dispensa seja feita, no caso de subsidiárias.
Dias Toffoli: em seu voto, o presidente da Corte acompanhou o entendimento aberto pelo ministro Alexandre de Moraes que permite a venda de estatais sem autorização do Congresso. "Para a subsidiária, eu entendo que não é necessário". Toffoli entendeu que é desnecessária a licitação nesses casos.

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