terça-feira, 23 de junho de 2020

Os entregadores antifascistas querem apps solidários à causa. Por que é importante ouvi-los.

                     Manifestação de entregadores de aplicativo delivery contra o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e a precarização do trabalho, em Pinheiros, zona oeste de São Paulo, em 7 de junho de 2020.
Uma das categorias mais precarizadas, os entregadores de aplicativos estão se organizando para exigir melhores condições de trabalho – e precisam do nosso apoio. Foto: Zé Carlos Barretta/Folhapress

GRANDES CRISES TAMBÉM são momentos de oportunidade, transformação e reinvenção das formas de luta. Além dos protestos antirracistas e pró-democracia, o recém-criado Movimento dos Entregadores Antifascistas, o MEAF, é mais um exemplo disso. O MEAF tem potencial de recriar um novo modelo de trabalho para a categoria no Brasil, mas também inspirar o mundo por meio de redes ativistas internacionais.

Foi preciso que estourasse uma pandemia, sob um governo que idolatra a morte, para que trabalhadores de aplicativos que denunciam o óbvio fossem ouvidos. Em um comovente vídeo, o entregador Paulo Lima, o Galo, listou as condições de trabalho desumanas a que sua categoria está sujeita, sem equipamento de proteção e álcool gel, rodando as cidades sem parar enquanto parte da população está em isolamento.

Não irei me aprofundar na precariedade do trabalho dos entregadores dos aplicativos, que representa o capitalismo predatório em seu estado mais bruto. Quero compartilhar de um sentimento de esperança que tomou conta de muitos atores da sociedade civil que buscam atuar junto ao movimento em uma ampla rede de ação.

Trabalhar junto aos movimentos não significa ensiná-los a fazer política, mas sobretudo distribuir recursos e trocar saberes plurais. Falamos muito em escuta na esquerda, mas me pergunto se a escuta real de fato existe neste mundo em que todo mundo quer falar, mas poucos querem ouvir. Somos nós – acadêmicos, intelectuais, jornalistas, trabalhadores, estudantes, ativistas de longa data – que temos que puxar nosso banquinho, sentar e ouvir atentamente o que pessoas como Galo têm a ensinar sobre exploração capitalista e organização nos dias de hoje.

A politização de Galo veio do rap das quebradas de São Paulo, mas também de sua própria condição de trabalhador precário. Ele é um gênio no sentido mais completo da expressão: possui uma visão política aguçada sobre precarização, alianças políticas, táticas e estratégias de luta. Com os pés no chão, ele sabe da importância do trabalho de formiguinha, mas também nutre sonhos dos grandes líderes.

Galo é uma das lideranças mais carismáticas e generosas que vi surgir nos últimos tempos. Ele tem a qualidade rara de combinar assertividade crítica e pragmatismo político com uma genuína generosidade para com os companheiros. Faz diagnósticos afiados acerca da perversidade do sistema para o qual trabalha, mas se emociona com a generosidade coletiva e mantém a fé na humanidade – a meu ver, o principal motor de luta.

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