Johann Moritz Rugendas
A Fundação Palmares foi criada através da Lei 7.668, de 22 de agosto de 1988, logo após o fim da ditadura militar, no processo de redemocratização que se seguiu. Foi vinculada ao Ministério da Cultura, também criado na redemocratização, em 15 de março de 1985. A Fundação visava ser uma trincheira para a preservação dos valores culturais, sociais e econômicos da negritude no Brasil e promoção da sua integração participativa com a construção nacional.
Bolsonaro acabou com o Ministério da Cultura. Agora quer acabar com a Fundação Palmares.
O governo dos milicianos dá continuidade à sua política de desconstrução nacional. Investe contra os grandes ativos econômicos do país – Petrobras, Embraer, empresas de engenharia; aniquila a política externa independente e coloca o país como capacho do americano; liquida com direitos dos trabalhadores, com a educação, previdência, organização sindical; avança contra os instrumentos de defesa do meio ambiente e toca fogo em nossas florestas; ameaça a liberdade de expressão, a criatividade artística, a ciência, a ilustração, a sabedoria.
Para acabar com a Fundação Palmares e golpear a negritude do Brasil, Bolsonaro lançou mão de um expediente pérfido, o uso de um negro degenerado pela cultura da opressão para agredir a negritude engajada na cultura da libertação. Essa é uma tática antiga que os dominadores racistas mais agressivos e maliciosos usaram na época dos nazistas e no tempo da escravidão no Brasil.
O articulista da Folha, Dodô Azevedo, lembra (na Folha de 27/11/2019) a figura grotesca de “judeus nazistas”, que defendiam Hitler, alguns dos quais se prestaram ao papel de guardas de segurança do gueto de Varsóvia, onde foram confinados e massacrados até a morte mais de 300 mil judeus, a partir de 1940, durante três anos. Recorda o judeu Max Naumann, que apoiou o programa nazista de Hitler, criticava o ativismo judeu de resistência, ridicularizava os heróis da luta judaica, até que um dia foi enviado para um campo de concentração.
Aqui no Brasil, na época da escravidão, os senhores de escravos usavam o “capitão-de-mato”, para ir à cata de escravos que fugiam do cativeiro, e trazê-los de volta, sob açoite, para os seus “donos”. E muitas vezes esses “capitães-do-mato” eram negros. Cumpriam uma função das mais desprezíveis na sociedade escravocrata. Eram verdugos de seu povo.
Mas, se de fato é uma afronta e um ultraje, a nomeação por Bolsonaro para a presidência da Fundação Palmares de um personagem tão reles quanto este Sérgio Camargo, por outro lado mostra fraqueza do bolsonarismo: não encontrou um negro ou branco digno, respeitado, conhecido, prestigiado pelos negros, para lhe servir. Teve que apelar para um ser desprezível, esse Camargo, que não honra nem a seu próprio pai, que foi o poeta, escritor, crítico e militante da causa negra nos anos 1960, Oswaldo de Camargo.
Para a educação política de nossa gente, seria bom confrontar a afirmação do Sérgio Camargo de que não há racismo no Brasil com o que disse o seu chefe Bolsonaro quando, em 28 de março de 2011, no programa CQC da TV Bandeirantes, foi perguntado pela cantora Preta Gil sobre como reagiria se um filho seu namorasse com uma mulher negra. Ele respondeu: “Não vou discutir promiscuidade”.
De qualquer forma, ante tamanha desfaçatez do Bolsonaro, os movimentos democráticos brasileiros, em particular as diferentes agremiações que compõem o movimento negro, deveriam desencadear protestos enérgicos e contínuos para a derrubada desse agente adversário que o presidente quer impor, para destruir, na Fundação Palmares.
* Haroldo Lima, ex-deputado federal, é membro da Comissão Política Nacional do Comitê Central do PCdoB
Nenhum comentário:
Postar um comentário